Está surgindo, em países onde o aborto foi legalizado, a tendência a reivindicar o abandono da criança que não foi abortada por decisão da mulher.
A defesa da legalização do aborto passa muitas vezes pela alegação de que o pai da criança pode abandonar a mulher grávida, deixando-a “com todo o encargo”. Ocorre que uma vez legalizado o aborto, a mulher, sozinha e soberanamente, terá o direito de abortar. Isso gera diversos problemas.
Um deles, é quando o pai não quer que seu filho seja abortado, mas por decisão da mãe, terá seu filho morto em um abortamento. Outro problema, é quando o pai não quer ter o filho mas a mãe abre mão do seu direito ao aborto. Neste caso o filho nasce, e o pai “tem que arcar” com as responsabilidades da paternidade contra sua vontade. Têm-se nestes casos um desequilíbrio entre direitos dos homens e das mulheres. Mas esse dilema não se restringe ao campo da lógica e da teoria, conforme demonstra o Dr. Eduardo Cabette no livro “Aborto legal: o direito de não ser pai“.
Na Europa, essa questão jurídica pelo equilíbrio entre direitos de procriação do homem e da mulher já se tornou assunto oficial em livros e no meio jurídico. Veja que não se trata de negação da paternidade biológica.
É de Portugal uma das obras específicas sobre o tema da negação voluntária da paternidade, do autor Jorge Martins Ribeiro, que argumenta:
“Os homens têm sido desconsiderados no respeitante à defesa da sua autodeterminação procriacional, positiva ou negativa, quando em confronto com a vontade da mulher. Os direitos reprodutivos da mulher merecem toda a atenção e em muitos ordenamentos jurídicos, como o português, esses direitos incluem não procriar através da interrupção da gravidez. Os direitos do homem têm sido esquecidos, para dizer o mínimo. De fato, poderia dizer-se que os seus direitos têm sido negados por uma sociedade que não só decide que uma mulher tem o direito de terminar com uma vida, abortando, mesmo que contra a vontade do presumido pai, mas que também aceita que a mesma mulher, se for o caso, tenha o direito de impor uma criança ao homem, independentemente de saber de antemão que a procriação é contra a vontade dele. A mulher tem o direito de por fim a uma vida, o homem não tem sequer o direito menos gravoso de rejeitar a paternidade. Ninguém deveria estar inteiramente dependente da vontade de outra pessoa numa sociedade regida pelos princípios da igualdade e da liberdade, todos deveriam se beneficiar da igualdade e liberdade possível em termos de procriação”.
Diversos detalhes sobre esse imbróglio são abordados pelo Dr. Eduardo Cabette tanto no livro Precisamos falar sobre aborto: mitos e verdades, quanto de forma mais completa no livro Aborto Legal e o direito de não ser pai, assim como em aulas disponibilizadas gratuitamente sobre esse tema, nos vídeos abaixo:
Parte 1 de 3: Eduardo Cabette – A rejeição da paternidade de filho nascido sem consentimento
Parte 2 de 3: Eduardo Cabette – A rejeição da paternidade de filho nascido sem consentimento
Parte 3 de 3: Eduardo Cabette – A rejeição da paternidade de filho nascido sem consentimento
Referências
RIBEIRO, Jorge Martins. O Direito do Homem a Rejeitar a Paternidade de Filho Nascido contra a sua vontade. A igualdade na decisão de procriar. Coimbra: Coimbra Editora, 2013, p. 7.
CABETTE, Eduardo Luiz Santos. Aborto Legal e Direito de não ser pai: uma abordagem à luz do Princípio da Igualdade nas trevas da consciência. Porto Alegre: Núria Fabris, 2014, “passim”.
DEROSA, Marlon Madalena (ORG.). Precisamos falar sobre aborto: mitos e verdades. Florianópolis: Editora Estudos Nacionais, 2018. 639 p.