Santo Tomás de Aquino, na Suma Teológica (II-II, q. 26), estabelece o Ordo Caritatis (Ordem da Caridade), que define a hierarquia do amor segundo a reta razão e a justiça. Ele aplica esse princípio aos diferentes estados de vida—vida religiosa, sacerdotal e matrimonial—determinando a prioridade do amor dentro de cada um. A seguir, apresento a explicação com citações diretas da Suma Teológica. Sua receita é mais do que necessária em nossos dias, quando as relações familiares dão origem a problemas espirituais e psicológicos, culminando no mal social de grandes proporções que afeta não apenas a família como também, e principalmente, a Igreja.
1. Vida Religiosa: O Amor Supremo a Deus e à Vida Contemplativa
Na vida religiosa, a prioridade máxima do amor é Deus e as realidades espirituais. O religioso abandona os laços terrenos para se dedicar totalmente a Deus e à oração. Os meios para isso são a perfeita obediência à Igreja por meio do seu superior, conforme ensinam os maiores santos da Igreja.
“A caridade tem por primeiro objeto Deus, a quem devemos amar mais que a nós mesmos, porque Ele é nosso bem supremo.” (Suma Teológica, II-II, q. 26, a. 3)
“Os religiosos, que se dedicam totalmente ao serviço divino, são mais próximos de Deus do que os seculares, e por isso são mais dignos de caridade.” (Suma Teológica, II-II, q. 26, a. 10)
A obediência ao superior é um reflexo da obediência a Deus. Os religiosos amam sua comunidade, mas sem laços de propriedade ou exclusividade, pois seu amor é universal.
2. Vida Sacerdotal: O Amor Prioritário ao Ministério e às Almas
O sacerdote, como mediador entre Deus e os homens, deve ordenar seu amor para que a salvação das almas seja sua maior prioridade. Sendo o próprio Cristo entre os homens, ele deve comportar-se com dignidade equivalente dentro das condições humanas com o auxílio da graça.
“Os sacerdotes e os religiosos são mais dignos de honra porque estão mais próximos de Deus, e devemos ter para com eles maior reverência e amor.” (Suma Teológica, II-II, q. 26, a. 10)
O sacerdote deve amar mais a Igreja e a salvação das almas do que laços familiares. Ele deve amar os fiéis de sua paróquia mais do que os desconhecidos, pois sua missão é cuidar deles. O sacerdote se sacrifica pelo rebanho, priorizando o bem espiritual da comunidade sobre preferências pessoais.
3. Vida Matrimonial: O Amor à Família e à Hierarquia Natural
No matrimônio, o amor conjugal e paternal segue uma ordem hierárquica natural e espiritual.
“Os pais devem ser amados mais que os filhos, pois os filhos procedem deles e lhes devem a vida.” (Suma Teológica, II-II, q. 26, a. 9)
“O homem deve amar sua esposa mais que a seu pai e sua mãe, porque a união com a esposa é mais íntima.” (Suma Teológica, II-II, q. 26, a. 11)
O marido e a esposa devem se amar mutuamente mais do que a qualquer outro ser humano, incluindo mais que os filhos. A esposa deve obediência ao marido, já que este deve dar sua vida pela esposa, conforme recomenda Nosso Senhor, em analogia com a relação entre Cristo e a Igreja, Sua Esposa. Em Efésios 5,22-24, são Paulo ensina: “Mulheres, sejam submissas a seus maridos como ao Senhor. Pois o marido é a cabeça da mulher, como Cristo é a cabeça da Igreja”.
Os pais devem amar seus filhos mais do que outros parentes, pois têm o dever de criá-los e guiá-los.
O amor aos pais permanece, mas cede lugar ao vínculo conjugal, pois “serão dois em uma só carne” (Gênesis 2,24).
Resumo
Na vida religiosa, o amor a Deus é absoluto; os laços terrenos são renunciados.
Na vida sacerdotal, o amor prioritário é à Igreja e às almas confiadas ao padre.
Na vida matrimonial, a hierarquia do amor segue a ordem natural da família, com primazia do cônjuge sobre os outros laços.
O Ordo Caritatis de Santo Tomás ensina a ordenar o amor corretamente, evitando sentimentalismos desordenados e garantindo que cada estado de vida reflita a vontade divina. Essa conformidade com os estados de vida e seus deveres é fundamental para a santificação, que é um chamado a todos os fieis na Igreja Católica.