A infiltração das ideias do movimento integralista entre os católicos foi uma preocupação de Plinio Corrêa de Oliveira já no início do seu ativismo católico. Em 1937, ele enviou aos bispos do Brasil, em caráter confidencial, o documento intitulado “Relatório imparcial ao episcopado brasileiro”, que pode ser lido na íntegra aqui.
Nele, o professor Plinio traça alguns erros importantes da doutrina integralista que são incrivelmente atuais diante da atual ameaça, muito semelhante, de infiltração da doutrina perniciosa de Aleksandr Dugin, assim como do perenialismo gnóstico de René Guénon, entre os católicos. Não é por acaso que, nas fileiras duguinistas do neofascismo mundial, encontram-se também os saudosistas do Integralismo, confusamente dispostos ao lado de satanistas, muçulmanos, teosofistas e católicos mal informados.
Não é possível saber se o referido documento teve influência na decisão de bispos, e também da Santa Sé, na rejeição do nome do então padre Helder Câmara para nomeação como bispo auxiliar, por conta da sua associação com a Ação Integralista Brasileira (ACB), da qual chegou a ser vice-presidente. O fato é que apenas na década de 50 o já bispo parece ter renunciado ao fascismo tupiniquim para poder ser, em seguida, um dos principais fundadores da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB).
Entre os aspectos ressaltados por Plinio Corrêa como avessos ao catolicismo, pesam alguns de grande similaridade com a atual roupagem do neofascismo russo apresentado por Dugin, como a filiação às doutrinas ocultistas e esotéricas, comungando das premissas do movimento da New Age e do Tradicionalismo perenialista que influenciou igualmente tanto o fascismo italiano quanto o nazismo.
O primeiro aspecto é o caráter ecletista do integralismo. Segundo o próprio autor da doutrina integralista, o seu movimento se constituiria numa espécie de super-síntese de toda a filosofia e a moral humana existente até então, o que ele culminaria no que ele chamava de doutrina da Humanidade. O ecletismo seria o aproveitamento de todas as filosofias, doutrinas, ideologias e religiões do passado em uma única síntese do presente, representada evidentemente pela Doutrina do Sigma, como a chamou o seu autor Plinio Salgado (o outro Plinio).
A grande confusão causada na época se deve à declaração dos integralistas de uma suposta conformidade com o catolicismo, o que o dr. Plinio Corrêa demonstrava falsa no seu documento. A análise da doutrina integralista demonstrou a incompatibilidade de maneira devastadora.
Em primeiro lugar, Salgado não aceitava a história sagrada como exposta na Bíblia, mas trazia uma outra concepção histórica, que considerava nova, mas apenas repetia um evolucionismo presente nas doutrinas esotéricas e ocultistas. Assim como Dugin oferece a sua Quarta Teoria, Salgado também oferecia a Quarta Humanidade, a Humanidade Integralista.
Da mesma forma, Salgado propõe recuperar o passado com os seus erros. Explica Plinio Corrêa:
A “síntese” a que se refere Plinio Salgado, é a filosofia nova, soma integral das filosofias anteriores, que abrangerá o pensamento oriental, com Jesus Cristo, Buda, Maomé; o pensamento grego, com Platão e Aristóteles; o pensamento medieval com S. Agostinho, S. Tomás e os nominalistas; o pensamento moderno com Hegel, Kant, Bergson e Marx.
Na história da Humanidade exposta por Salgado, ressalta um evidente evolucionismo ao considerar que a humanidade teve primeiro uma religião politeísta, depois monoteísta, depois ateísta e, por fim, a integralista.
Ora, a humanidade não começou como politeísta. Este é o erro clássico do evolucionismo histórico que nega o cristianismo. Plinio Corrêa ressalta a contradição explícita dessa crença exposta na doutrina integralista:
Ninguém ignora que há divergências entre os historiadores, a respeito da origem da religião na humanidade primitiva. Os evolucionistas afirmam que o homem foi primeiramente politeísta, e só depois monoteísta. Com isto, estaria destruída a tradição bíblica, que nos mostra o primeiro casal humano, e seus filhos, adorando um Deus único. Os católicos, pelo contrário, afirmam que o homem foi primitivamente, monoteísta. Mais tarde, alguns povos decaíram para o politeísmo. Incólume, só ficou o povo eleito.
Com isso, Plinio conclui que o Integralismo rejeita a visão bíblica e adere ao evolucionismo histórico, o que em vários sentidos é oposto ao catolicismo.
Qual o conceito de Deus para Plinio Salgado? Plinio Corrêa cita um trecho em que fica evidente a heterodoxia do “catolicismo” integralista.
“É que acendes teu fogo imortal, Destino dos Povos, no risco fosfóreo do Boitatá, nas fagulhas da Mãe de Ouro, na brasa do cachimbo do Curupira e do Saci, nos largos sertões, como se fosse a própria alma do Brasil ígnea e palpitante.” (Plinio Salgado, A Quarta Humanidade, pg. 145 <2ª ed. p. 147>).
Em seguida, Plinio Corrêa também analisa os textos de outro importante nome da ideologia integralista, o célebre Gustavo Barroso.
Em um dos esquemas finais do seu livro [O que o integralista deve saber] ↓6, Gustavo Barroso traça a posição religiosa da doutrina do sigma.
<“Deus é o ponto de convergência de todas as religiões7 – afirmação básica de todas – em que se coloca o integralismo para fundamentar a ordem social.” (Gustavo Barroso, O que o integralista deve saber, Apêndice [esquema] V).>
<Cumpre notar que o Budismo aceita diversos deuses, que não têm poder para auxiliar os mortais. O bramanismo e o teosofismo são francamente panteístas, isto é, aceitam um Deus que se confunde com a natureza, e é um ser que não tem consciência de si mesmo. Qualquer destas concepções cabe na concepção integralista de Deus.>
Como podemos observar por estes rápidos trechos, Plinio Corrêa alertou suficientemente os católicos para o perigo do integralismo, o fascismo brasileiro da época. Não obstante, atualmente uma nova tentativa de seduzir os católicos por meio de ideias pagãs e ocultistas parece obter espantoso sucesso entre nós, desde que as ideias de Aleksandr Dugin começaram a circular pela rede e cairam nas mãos de católicos eufóricos por uma ideologia política. Assim, os erros da Rússia se vão espalhando, aproveitando-se do rastilho de pólvora lançado pelo indiferentismo religioso que vem se tornando a metafísica preferida dos movimentos conservadores ansiosos por alianças políticas mais do que pela salvação da própria alma.