Quando Lula se refere ao filho gerado por um estupro como “monstro”, ele está repetindo uma crença bastante comum no tempo em que a lei do aborto foi aprovada no Brasil. Essas ideias, pouco conhecidas, ficam ainda mais sombrias quando compreendemos a raiz histórica e simbólica que congrega a ampla diversidade das propostas progressistas modernas.
Originalmente, a tese por trás da facilitação do assassinato do bebê gerado por meio de um estupro, traz a crença de que os genes criminosos eram transmissíveis geneticamente. Essa crença, junto da justificativa de eliminação para se evitar essa suposta transmissão, que resumem a ideia de seleção artificial, fazem parte do conjunto de ideias eugênicas que marcaram a primeira metade do século XX. Depois do horror da Segunda Guerra, essas ideias precisaram modificar-se na sua apresentação por contarem com financiamento e estrutura grandes demais para serem abandonadas. Mais do que isso: as mentes por trás delas são muito mais poderosas do que meros metacapitalistas ou financistas globais.
O que pouca gente sabe é que a eugenia não é um conjunto de crenças científicas. De fato, as ideias eugênicas se utilizaram do discurso científico, mas para disseminar crenças que no fundo estão ligadas às sociedades secretas e movimentos espiritualistas profundamente influentes na política do século XX.
O feminismo e as raças-raiz
Para compreender o fundo esotérico e ocultista da eugenia, precisamos recorrer à antropóloga feminista Margaret Sanger, famosa por sua ligação com a Ku Klux Klan, com a Sociedade Eugênica Americana e considerada fundadora da mais famosa clínica de aborto do mundo, a Planned Parendhood. Sanger pode ter sido a mais famosa autora a deixar registrado o seu desprezo pela vida dos mais pobres. Em seu livro Pivot Of Civilization, ela promoveu a esterilização com o objetivo de eliminar fisicamente certos grupos de indivíduos portadores do que ela chamou de “genes indesejáveis” para “melhorar o ser humano”.
No ano passado, publicamos um artigo contando essa história, que liga a defesa do aborto, a ideologia de gênero e o ocultismo, numa mesma pessoa. Engana-se quem acha que a eugenia é uma doutrina materialista, utilitarista e desumana “apenas”. Associa-la ao nazismo é correto, mas em geral para-se por aí, deixando de avançar sobre os pressupostos por trás dos próprios ideais nazistas. O próprio nazismo, muitas vezes, considerado apenas um tipo mórbido de racismo, é frequentemente abstraído de suas raízes literalmente diabólicas.
Acontece que a ideia por trás da eugenia era a de uma profecia mística que previa o aparecimento de uma nova raça espiritualmente superior. Note-se que a superioridade era espiritual, mas foi tratada como biológica apenas por sua potencialidade de aproveitamento político, seja a partir das doutrinas darwinistas em voga na época, seja por instintos populares de defesa nacional em um período em que o comunismo se apresentava como um tipo de expansionismo internacionalista, ameaçando os nacionalismos.
A verdadeira chave para entender a eugenia, portanto, está na doutrina da ocultista russa Helena Blavatsky, para quem a raça prometida apareceria na face da Terra como um estágio final expresso na sua teoria das “raças-raiz”. Os seguidores de Blavatsky se dividiram em diferentes perspectivas, dando origem a diversas teorias sobre onde surgiria essa nova raça.
Blavatsky também influenciou o avanço da antroginia, já que uma das raças superiores espiritualmente tinha essa característica. A influência de Blavatsky no movimento New Age é tão grande que não se pode compreender a cultura moderna, a contracultura e o desenvolvimento da cultura pop contemporânea sem ela. Portanto, tanto o feminismo quanto a Teoria Queer possuem claras ligações com as ideias da russa-germânica.
Ramos da teosofia
Os alemães criaram a Ariosofia, ramo germânico da teosofia, que afirmava que essa raça apareceria na Alemanha e aliada às suas raízes linguísticas, que autores como Guido Von List acreditavam estar na Índia. Por isso, a suástica foi extraída, entre outros elementos, de símbolos indianos.
Mas há também o ramo americano da teosofia, que conta com profundas ligações com o movimento globalista da esquerda internacional. Alguns expoentes norte-americanos da Sociedade Eugênica acreditavam que essa raça prometida viria no território dos Estados Unidos. Margaret Sanger era uma adepta dessa versão. Mas não somente ela.
Hoje sabemos do papel da família Ford no apoio ao nazismo durante a Segunda Guerra. Henri Ford pessoalmente criou um jornal para defender Hitler nos EUA. Essa simpatia não era à toa.
Hoje também sabemos da profunda ligação da Fundação Ford com o financiamento das políticas de ações afirmativas racialistas, baseadas na acusação permanente de racismo. Nos anos 60 e 70, quando a Ford desembarcou no Brasil, a esquerda acusava a fundação de promover no Brasil um conceito imperialista de raça, isto é, um conceito importado dos Estados Unidos. Que conceito era este? Um conceito ligado a uma hierarquia e portanto gerador de um sentimento de culpa, uma esperança na preparação da sociedade para um mundo futuro em que as raças se respeitariam e tolerariam. Mas para isso seria preciso eliminar as diferenças.
Anos depois, com o financiamento da esquerda pela Fundação, a grande maioria dos intelectuais de esquerda aderiram ao oportuno silêncio sobre isso. Mas a realidade frequentemente reaparece, nem que seja na boca de um presidente.