Inicialmente com presença confirmada da Ministra da Cultura, Margareth Meneses, o evento Russia Session 2024 será sediado no Brasil e propõe a divulgação da cultura russa no país visto como estratégico pelo Kremlin. O evento ocorre em meio à invasão russa contra a Ucrânia, que já pode ter matado mais de 30 mil ucranianos desde seu início, em fevereiro de 2022.
Depois de confirmar a participação no evento, porém, e talvez temendo desgaste político, a Ministra da Cultura desmarcou sua presença. O apoio do governo ao evento significaria uma tomada de posição ainda mais clara em favor da invasão à Ucrânia pela Rússia, embora o presidente Lula tenha buscado evitar a clareza de posição.
O acontecimento, que terá a abertura no dia 17 de junho, no Theatro Municipal do Rio de Janeiro, ocorre logo após uma tensão entre o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o líder ucraniano Volodymyr Zelenski, que cobrou do presidente brasileiro uma posição mais firme sobre a invasão russa ao seu território. Lula já criticou Zelenski, mas diz buscar uma “solução pacífica”.
A postura dúbia do governo brasileiro sobre o conflito se explica pelo alinhamento de Lula ao bloco BRICS, coordenado pela Rússia e núcleo geopolítico da proposta do chamado Mundo Multipolar, tese do ideólogo do Kremlin, Alexander Dugin, que é apoiada por líderes autoritários e populistas tanto de direita quanto de esquerda, incluindo regimes islâmicos radicais.
O evento de propaganda do governo russo no Brasil terá a presença da ministra da Cultura da Rússia, Olga Lyubimova, que defende a invasão bélica à Ucrânia.
As razões do cancelamento da presença da ministra brasileira não foram informadas e o apoio do governo federal sobre o evento também ficaram dúbios.
“A ministra agradece o convite feito pelo governo russo e seguirá cumprindo sua agenda de compromissos”, informou o Ministério da Cultura ao jornal Gazeta do Povo. Inicialmente, a ministra havia confirmado presença no evento, conforme noticiado antes.
Tensão ideológica
O governo brasileiro se vê numa corda bamba entre a esquerda identitária e a esquerda autoritária, o que explica o silêncio e indecisão sobre o conflito.
De um lado, Lula é apoiado por grandes globalistas e deseja se afirmar como voz “ponderada” sobre conflitos globais, fato representado pela ambição por uma cadeira no Conselho de Segurança da ONU. De outro lado, militantes petistas e da esquerda tradicional sempre estiveram alinhados à Rússia, que mantém apoio estratégico ao Foro de São Paulo, assim como ao bolivarianismo da América Latina, que conta com parcerias militares com a Rússia e China.
Movimentos pró-Rússia crescem no Brasil
A ideologia russa do eurasianismo cresce em adeptos no Brasil, colhendo simpatizantes tanto na direita quanto na esquerda.
Para alguns conservadores, a Rússia aparece como uma opção contra a agenda globalista ocidental, cujo projeto é representado por ideias como o “grande reset”, de controle econômico, e a difusão de ideologias de pautas identitárias, aborto etc.
Já para a esquerda, a importância está na oposição ao liberalismo ocidental e ao capitalismo. Esquerdistas cansados das pautas identitárias e do próprio discurso igualitário, anseiam pelo retorno ao autoritarismo marxista, que guarda grande semelhança com o neofascismo proposto pela Rússia.
Mesmo entre conservadores, a oposição ao Ocidente passou a ser uma pauta vista como legítima, assim como o apoio indiferentista a tradições religiosas em detrimento do “materialismo” e individualismo ocidental. Ocorre que, para os russos, o tradicionalismo indiferentista, isto é, o chamado perenialismo, é estratégico devido à necessidade do país em unir o seu nacionalismo à matriz diversa que caracteriza o território e a população russa.
Por trás do tradicionalismo, porém, avança sobre o Ocidente o islamismo, principalmente entre jovens cansados dos efeitos culturais e comportamentais da antiga subversão soviética, base da revolução sexual promovida no Ocidente.
Na Europa, movimentos de direita já são literalmente financiados pelo Kremlin, uma tendência que indica migração para o Brasil, onde influenciadores conservadores já demonstraram afinidades e apoios declarados. O Kremlin já domina movimentos pró-vida na Europa e no Brasil, como indicamos recentemente.
O Instituto Estudos Nacionais vem acompanhando a difusão da ideologia russa no Brasil entre os conservadores ao longo dos últimos anos, especialmente após a guerra da Ucrânia. O lançamento do livro O Sol Negro da Rússia: as raízes ocultistas do eurasianismo, marca a história desses estudos no Brasil, mais de 10 anos após o debate histórico entre o filósofo Olavo de Carvalho e o ideólogo Alexander Dugin, no qual o filósofo brasileiro desmascarou as intenções e fontes ocultistas por trás de um projeto que explora o anseio ocidental de retorno das tradições para cooptar militantes.
O livro O Sol Negro da Rússia já pode ser adquirido na Livraria do Instituto Estudos Nacionais clicando aqui.