Um acontecimento que deveria servir de alerta para conservadores brasileiros indiferentes ao crescimento das ideologias de terceira posição, isto é, do antimodernismo igualitário das ideias neofascistas no seu meio, é a crescente aproximação da direita europeia com as ideias russas. Recentemente, o governo alemão incluiu o partido de direita Alternativa para a Alemanha (AfD) na lista de movimentos extremistas. Conservadores do mundo, desavisados, saíram em sua defesa sem dizer uma palavra da ligação estreita do partido com as ideias eurasianas, caracterizadas por um resgate do misticismo nazista com nacionalismo trabalhista.
Para os europeus, no entanto, a ligação do AfD com a Rússia é óbvia e conhecida.
No estado alemão da Bavária, o AfD afirma ter rompido “laços com o Ocidente”, conduzindo eles próprios suas negociações diretamente com o Kremlin. Para eles, a Alemanha deveria parar imediatamente o fornecimento de armas à Ucrânia, deixando que os ucranianos morram sem defesas pelas mãos russas. Contra as sanções globais à Rússia, o estado bávaro se considera parte da “Eurásia”. Para eles, Putin não tem qualquer culpa por conduzir a invasão da Ucrânia, sendo os responsáveis “a CIA, os EUA e Biden”.
Isso pode ser lido na “Iniciativa de Diálogo da Baviera para a Paz na Europa”(Bayerischen Dialoginitiative für Frieden in Europa), resolução adotada pela AfD na sua conferência regional em maio de 2023.
Em poucas palavras, a AfD da Bavária deseja um estado que seja:
“um construtor de pontes entre o Oriente e o Ocidente, em vez de um apoiante da geopolítica de Biden, que tenta dividir deliberadamente a Eurásia para servir os interesses dos EUA”.
Unindo militantes de extrema esquerda e extrema direita, a Rússia fomenta suas ideias de terceira posição para instrumentalizar o BRICS, que em suas mãos vem se tornando uma espécie de “internacional fascista” para apoiar quase qualquer tipo de regime autoritário, desde que seja contra os EUA, ao Ocidente, e não tenha muita preferência pelo cristianismo ocidental.
No Brasil, a figura mais conhecida da esquerda associada à Rússia e ao ideólogo Aleksandr Dugin é o militante esquerdista Pepe Escobar, que durante a prisão de Lula, entrevistou o atual presidente a serviço do site petista Brasil 247, site que vem defendendo abertamente a agenda russa por parte da esquerda, juntamente com movimentos como o Partido da Causa Operária (PCO). O 247 também já abriu espaço para o líder do Nova Resistência, o ativista Raphael Machado.
Ao mesmo tempo, apesar do ideólogo russo ter conclamado uma união contra o ex-presidente Jair Bolsonaro, alguns pós-bolsonaristas caem no canto neofascista, aproximando-se perigosamente de discursos associados diretamente com fontes que flertam com o neonazismo. O chamariz para eles é a retórica antiglobalista, que se diz contrária ao transumanismo ocidental da Nova Ordem Mundial, mas promete uma ordem global “multipolar”, espécie de nova libertação a ser conquistada mediante ações estatais em apoio às causas russas. Neste jogo de “libertação”, une-se todo tipo de misticismo pseudo-tradicional, resgatando ao mesmo tempo a mística nazista com elementos da New age, fartamente disseminados por médicos alternativos durante a pandemia.
Desamparados pelo fim do bolsonarismo, alguns jornalistas e influenciadores viram na Rússia a chance de angariar dinheiro para o seu trabalho, como foi o caso recente de jornalistas pagos pela estatal RT. Em um ambiente onde a retórica antiglobalista serve de disfarce para uma agenda claramente antiocidental e anticristã, o restante dos ativistas e jornalistas da direita brasileira não encontra nem mesmo meios de denunciar o problema, já que se fez refém da ditadura de pautas da esquerda jornalística que, em breve, os criminalizará como ocorre na Alemanha.
O problema parece partir de uma falta de linguagem para uma necessária distinção entre conservadorismo autêntico e a versão russa que vem sendo paulatinamente construída e substituída. Toda a reação conservadora ao globalismo tende, assim, a ser monopolizada pelo Kremlin, da mesma forma como fez com os trabalhistas do século passado.
O Brasil ainda não tem um partido pró-Rússia oficialmente. Mas considerando o aporte financeiro que vem sendo injetado pelo regime de Putin no continente, a iniciativa pode gozar de grande interesse em breve. Por enquanto, a agenda contará com ativistas bem posicionados e protegidos pelo silêncio seletivo de parte da direita que se sente mais atraída pelos tópicos montados pela rede de desinformação russa, embora ainda se fixe em defesas da “liberdade de expressão”. Quando denunciadas as ligações de conservadores com neofascistas pró-russia, essa defesa da liberdade será facilmente usada como confirmação da adesão a discursos neonazistas com farta fundamentação.
Neste sentido, a defesa do AfD por parte da direita seria precisamente o que desejam os globalistas. Ainda mais em nome da “liberdade de expressão”. Afinal, na Constituição não há liberdade para disseminar discursos neonazistas. E quem dirá que não o são?
Evidentemente, essa esquerda jornalística não tem mencionado as ligações do AfD com a Rússia, de maneira a avançar uma criminalização da direita de maneira geral, temendo indispor-se com o governo petista que apoia a agenda globalista alternativa de Putin. Por esse motivo, será apenas a direita associada a esse movimento que será criminalizada, enquanto se faz vista grossa para a mesma aproximação mantida pelas esquerdas.
Um dos pontos de ligação entre o Partido dos Trabalhadores e a internacional fascista representada pelo BRICS e chefiada pela Rússia, é o site Brasil 247, que reúne entre seus colunistas o petista Pepe Escobar, que recentemente tem se tornado grande apoiador do Kremlin.
Nos relatórios do governo americano sobre as operações russas na América Latina, aparecem tanto o Nova Resistencia quanto Pepe Escobar, ligado a Lula por meio do Brasil 247.
Ex-colunista da Folha que foi afastado após polêmicas envolvendo plágio de textos, Pepe Escobar parece ter se indisposto com a esquerda cultural e se afastou, tornando-se um outsider do sistema. Rapidamente, apareceu citado em documentos internos do Departamento de Estado dos EUA que o ligam a uma rede de desinformação ligada ao governo russo e com conexões com a chamada “extrema-direita mundial”. Ele reaparece envolvido com uma rede de jornalistas pró-Rússia e anti-Ocidente, tendo como base a amizade com Aleksandr Dugin.
A esquerda jornalística não irá criminalizar as atividades de Escobar, seu velho amigo. Antes, o fará contra a direita indiferente ao tema, que flerta perigosamente com o neofascismo, uma velha acusação por parte da esquerda que passará facilmente da associação vazia para a denúncia fundamentada e verídica graças à própria indigência intelectual de um meio conservador que, no entanto, teve o professor Olavo de Carvalho como base para análises conjunturais.