Impulsionado pela onda tradicionalista, os neofascismos são a onda política que mais cresce na atualidade. Isso demanda uma compreensão maior sobre este fenômeno que conta com pouca ou nenhuma atenção por parte de conservadores e cristãos, fazendo-os presas fáceis às acusações e rotulações vindas de setores da esquerda que conhecem o suficiente da natureza do fascismo para ocultá-lo. Mais ainda, o avanço do islã entre grupos mais jovens aponta para uma influência histórica pouco comentada, mas que proporciona a antecipação de uma tendência bastante perigosa.
Acontece que a esquerda falsificou premeditadamente o conceito de fascismo, ocultando suas bases metafísicas e ocultistas, sabendo que estava escondendo algo que a comprometeria igualmente. Assim, eles consideram como “fascista”, tudo aquilo que se aproxima de uma “truculência irracional”, isto é, de um jeito agressivo e pouco afeito ao debate público, campo dominado pelos fingimentos da esquerda. Quem, portanto, não aceite o tecido de fingimentos é chamado de fascista. Mas se o conceito foi tão grosseiramente falsificado pela esquerda, tampouco é compreendido pela direita, que em alguns casos até reforça o estereótipo para irritar esquerdistas sem perceber que está trabalhando para manter certas correntes em crescimento discreto.
Se a esquerda esconde o fascismo para ocultar suas ligações históricas, o mesmo se pode dizer do islamismo, que teve impacto fundamental no crescimento do antimodernismo ocidental, isto é, de uma reconstrução do oriente pelo ocidente e vice-versa.
Até o presente momento, quando os neofacismos ganham até espaços na política partidária junto de um discreto islamismo na cultura, a direita permanece fingindo que o fenômeno não existe, preferindo a defesa acalorada de pressupostos do liberalismo e do modernismo e até do grosseiro punitivismo jurídico brasileiro, todos eles já previamente desenhados e enfeitados conforme suas próprias fragilidades pela esquerda hegemônica e que serão facilmente substuitidos pelas forças em crescimento na esfera intelectual. A necessidade de entendimento disso é, portanto, urgente.
Na busca de compreender o fenômeno neofascista da atualidade, não podemos deixar de fora as observações de escritores e historiadores que se aprofundaram no tema. O neofascismo, como filho dos antigos fascismos, é também um resultado de uma série de crises, sejam elas políticas, econômicas, psicológicas e morais. Anthony James Gregory foi um dos mais proeminentes estudiosos do fascismo, embora defensor de uma forma nova da ideologia. Ele acertou ao diagnosticar que o problema fascista possui tantas definições e interpretações diversificadas que o torna quase como um beco sem saída.
No entanto, em uma análise publicada em 1997, Gregory conclui que o fascismo é um resultado do abandono de Marx e Engels por parte dos marxistas, ainda que seja uma das muitas correntes marxistas. Em sua obra As Faces de Janus: Marxismo e Fascismo no Século XX, Gregory demonstra as ligações íntimas entre marxismo e fascismo ao longo do século XX. Os debates sobre a natureza ideológica do nazismo se tornam claros quando compreendemos essa ligação complexa. Com um significado ambíguo e muitas vezes confuso, o termo fascista tem sido utilizado pela esquerda para classificar quaisquer tipos de ideologias conservadoras. No entanto, a natureza revolucionária do fascismo é, muita vezes, deixada de lado e até mesmo interpretado como “contra-revolucionário”. Mas essa é a típica interpretação da esquerda cultural e identitária, cujas rotulações apenas se referem às suas revoluções subjetivas e oposições programáticas. O livro de Gregory, porém, investiga o conceito através da definição de totalitarismo, um tema presente em ambas as ideologias e que remonta à mentalidade revolucionária no seu ultranacionalismo típico da modernidade. É dessa forma que Gregory identifica como fenômeno tipicamente fascista a China maoísta, o que afastaria a tese do “fascismo de direita”.
Da mesma forma, o historiador israelense de esquerda, Zeev Sternhell, na obra O Nascimento da Ideologia Fascista, também questiona a filiação do fascismo como um fenômeno de direita ou conservador. Pata ele, o fascismo anda mais é que uma “resposta revolucionária” às crises sociais e políticas da história. Sendo ele próprio de esquerda e revisionista histórico, Sternhell defende o fascismo como uma expressão radical que, embora surgido em contextos específicos, não pode ser rigidamente classificado. Essa definição se aproxima bastante das vertentes ligadas ao eurasianismo, tema deste livro, que buscam “limpar” a imagem do fascismo na opinião pública para readmiti-lo em uma nova roupagem cultural e estética. Embora elogiado por grupos de neofascistas, Sternhell adverte sobre o perigo fascista, destacando a possibilidade dessa ideologia ressurgir em diferentes formas, independentemente de preferências políticas específicas.
Com base nos maiores estudiosos do assunto, é possível compreender, como sugere Olavo de Carvalho, que a ideologia fascista, em si, não corresponda de fato a interesses de uma classe ou grupo determinado, mas que possui incrível capacidade de se adaptar aos do grupo que o apoie. “Quando o apoio vem dos capitalistas, ele defende a classe capitalista. Quando vem dos trabalhadores, torna-se ferozmente anticapitalista. Há pois um fascismo “de direita” e um “de esquerda”. diz Olavo.
O filósofo Olavo de Carvalho considera relevantes os estudos sobre fascismo de Gregory e Sternhell, mas argumenta que ambos deixaram de fora um elemento importante na definição das influências fascistas no século XX, especialmente no que se refere ao antimodernismo e antiocidentalismo: a influência islâmica. Olavo considera como principal elemento iniciador das teses antimodernas o orientalismo ocidental trazido por René Guénon, um dos mais influentes intelectuais das elites europeias.
Em 2015, o professor notou que uma sedução islâmica estava em curso em meios conservadores e alertou sobre o assunto, tal como temos alertado recentemente.
“O Islam tem seduzido muitos conservadores desesperados por meio de apelos a ‘valores tradicionais’, à ‘revolta contra o mundo moderno’ etc. Já passei por isso trinta anos atrás. Com duas diferenças:
- Tive a sorte de me filiar a uma tariqa na qual nem se falava de ‘conversão’.
- Na época o terrorismo islâmico era incipiente, parecia uma anomalia passageira sem a menor conexão com a ‘autentica tradição’ muçulmana. Hoje em dia, todo cristão de origem que desespera da Igreja e vai buscar ‘valores tradicionais’ no Islam (ou até na Rússia de Putin) é apenas um inocente útil a serviço de algo cuja malignidade lhe escapa por completo”.
Sobre este assunto, Olavo recomenda a leitura do livro Islamic Antichrist, de Joel Richardson, que aponta evidências de que o Anticristo, conforme mencionado na Bíblia, terá ligações com a religião islâmica. Richardson argumenta que as profecias apocalípticas indicam que o Anticristo será associado ao mundo muçulmano, e não a uma entidade ocidental. Através de paralelos entre as profecias bíblicas e as crenças islâmicas sobre o Mahdi, uma figura messiânica esperada pelos muçulmanos, Richardson sugere que as características atribuídas ao Anticristo nas Escrituras cristãs encontram correspondências no Mahdi islâmico.
A conjuração islamo-fascista e seus resultados
Sabendo do crescimento do tradicionalismo, que levará a juventude inevitavelmente a dividir-se entre os neofascismos e o islã (quando não aderirem conjuntamente a ambos), a esquerda já produziu novas falsificações para aparentar entendimento e explicação da realidade, como no livro de Benjamin Teitelbaum, War for Eternity – Inside Bannon’s Far-Right Circle of Global Power Brokers (Guerra pela Eternidade – Dentro do círculo de extrema direita dos poderosos globais). Nele, o autor inventa uma união entre Olavo de Carvalho, Dugin e Steve Bannon, como “discípulos” de René Guénon. Os efeitos práticos dessa falsificação são vários. O livro oculta as críticas feitas por Olavo ao tradicionalismo e joga para debaixo do tapete todas as possíveis refutações radicais presentes na própria doutrina cristã a respeito dessa heresia gnóstica, base comum de Guénon e Dugin.
O livro encontra respaldo nas inúmeras acusações contra Olavo presentes na web, e enormemente generalistas, vindas de tradicionalistas católicos pouco atentos, como Orlando Fedeli. Enquanto este e outros católicos desperdiçavam tempo atacando Olavo, simultaneamente davam pouca ou nenhuma atenção para o crescimento do verdadeiro gnosticismo guenoniano. Graças a esses esforços puramente egocêntricos de alguns, a versão de Teitelbaum resultou hegemônica e aparentemente vitoriosa, servindo de principal referência para a esquerda, sendo que o avanço do interesse por René Guénon passa a ser referido apenas para culpabilizar Olavo de Carvalho, cujas críticas ao guenonismo são oportunamente omitidas.
O resultado de jogar no mesmo saco tanto Olavo quanto Dugin é óbvio: a criminalização de toda crítica ao globalismo por representarem respaldo às origens do atual neofascismo (e até do terrorismo islâmico) tornará inútil quaisquer tentativas de reverter isso pela política ou nas narrativas na opinião pública. Tudo o que cresce na esfera intelectual só pode ser combatido naquela esfera. Livros só são refutados por livros, não por artigos (como este), assim como mentiras históricas jamais serão revertidas por “políticas públicas” ou leis de incentivo, coisa que a direita brasileira está imensamente longe de perceber.
As críticas de Olavo a Guénon, porém, são inseparáveis do entendimento da sua contribuição intelectual, essencialmente nas análises da influência do ocultismo sobre a política moderna, como mostra o trecho abaixo de um livro ainda não lançado, mas cujo trechos está disponível em seu site.
Seja por ignorância genuína, seja por astúcia, Guénon reduz a civilização do Ocidente a uma mescla de capitalismo, materialismo cientificista e pseudo-religiões populares. Os últimos resíduos de espiritualidade que ele enxerga nela são a Maçonaria decadente e o catolicismo reduzido a uma perspectiva “exotérica”, já sem contato com as “fontes da Tradição primordial”. Fontes localizadas, é claro, no Oriente, mais especificamente nas regiões da Sibéria Central, daMalásia e do Tibete percorridas por Ferdinand Ossendowski em 1920 segundo a narrativa de Bêtes, Hommes et Dieux onde o famoso explorador conta ter penetrado no santuário subterrâneo do próprio “Rei do Mundo”. Coincidência ou não, essas regiões são as mesmas onde se concentra a maioria das “Sete Torres do Diabo”, centros irradiadores, segundo o próprio Guénon, de influência diabólica sobre o planeta inteiro.
Aqui Olavo deixa claro a sua suspeita sobre Guénon, considerando a possibilidade de uma “coincidência” apenas por bondade irônica. Afinal, como demonstrou Antonie Motreff, em seu livro sobre Guénon, a influência espiritual referida pelo sufi muçulmano, à luz da doutrina católica, não pode ser outra coisa senão demoníaca. Já sabemos o que Guénon escreveu sobre Lúcifer na juventude, época em que fora iniciado na Tariqa e na qual se dizia católico ao mesmo tempo em que defendia que a Maçonaria exercesse autoridade espiritual sobre Ocidente, o que de certa forma ele antecipou.