Por mais irônico que possa parecer, desde 11 de setembro de 2001, que matou mais de 3 mil pessoas, a imagem do islamismo no Ocidente vem cada vez mais se afirmando como “religião da paz”. Já os islâmicos, passaram a ser vistos como as maiores vítimas da “guerra ao terror”, desencadeada após o ataque. Embora esse episódio tenha levado ao conhecimento do mundo termos como “islamofobia”, o projeto de islamização do Ocidente é bem mais antigo, correndo pelos subterrâneos das elites globalistas há muito tempo. Esse processo é ampliado e aprofundado pelo desconhecimento ocidental cada vez mais gritante sobre a fé cristã, tragada tanto por progressistas quanto por conservadores, pela moda dos diálogos entre religiões, estudos comparados dentro da premissa dominante de uma nova moda orientalista.
Por trás do problema da sedução eurasiana, que tem sido tema frequente de artigos no Instituto Estudos Nacionais, a busca por uma solução contra os incômodos sociais provocados pela militância identitária e a chamada cultura woke tem levado cada vez mais conservadores e progressistas do Ocidente a um processo de ruptura com a atual cultura libertária desencadeada pelas revoluções sociais do século XX. Para além do problema da expansão russa, cujo messianismo vem se travestindo de canto de sereia para muitos conservadores e tradicionalistas, o islamismo vem há décadas colhendo avanços sutis, mas não menos relevantes no mundo ocidental.
Em um artigo publicado no site Jihad Watch, Alexander Maistrovoy traz alguns exemplos de como o islã vem crescendo como uma opção não apenas para conservadores cansados do materialismo individualista das “elites atlantistas” do Ocidente, mas também grandes nomes dessa mesma elite e do próprio sistema globalista como uma espécie de grande negócio. Afinal, ninguém imaginaria que para resolver o caos social e humano provocado pela cultural woke os globalistas iriam recorrer ao estímulo da vida cristã monástica ou da volta das escolas catedrais. Se há uma tradição em vias de ocupar o espaço vazio e pérfido deixado pela espiritualidade new age, esta só poderá ser aquela tradição que vem há décadas se colocando acima de todas as outras por meio de seus organismos esotéricos, as tariqas.
O professor Olavo de Carvalho, por mais de uma vez, alertou para este fato. Segundo ele, que teve experiências vividas dentro dessas organizações esotéricas islâmicas, a função das tariqas não é, como no movimento new age, desfigurar as diversas tradições religiosas esvaziando-as de seus significados, mas, mantendo-as intactas, trocar apenas a autoridade espiritual sobre a qual está submetida.
Disfarçadas de centros de estudos de religiões comparadas, essas organizações nem precisam, como dizia o professor, falar abertamente sobre islamismo. Pelo contrário, eles enriquecem a noção tradicional das várias religiões a partir de uma incrível e, diríamos, hipnótica superioridade intelectual.
Em seu artigo, Maistrovoy recorda de todas as confusões modernas causadas pela cultura woke e suas consequências não apenas morais, mas psicológicas, culturais, que levam à completa destruição de todas as formas de convivência. Esse cenário de terra arrasada clama por um centro ou um elemento espiritual que retome a hierarquia universal. E o Islã está pronto e sedento para isso há muito tempo.
Junto da cultura woke, a ideologia racialista termina por devastar todo o patrimônio ocidental tratando-o como “racista” e homofóbico, destruindo monumentos e queimando livros que tratam da tradição ocidental propriamente dita. Dos escritores do Renascimento, porém, salvam-se quais? Apenas aqueles que possam ser associados como um produto do resgate e interesse pela cultura árabe, islâmica e oriental. Portanto, depois de destruir tudo, o que poderia ser pior? Dizer que o verdadeiro Ocidente está no Oriente.
Para isso, o Islã, por meio das influentes tariqas, já possui vozes suficientemente influentes para reestruturar e dar a linha mestra sobre a qual a intelectualidade chique e aburguesada irá se deleitar. Maistrovoy recorda do discurso de Obama, em 2009, por ocasião da sua viagem ao Cairo.
“Também sei da dívida da civilização com o Islã. Foi o Islã – em lugares como a Universidade al-Azhar – que carregou a luz do aprendizado através de tantos séculos, abrindo caminho para o Renascimento e o Iluminismo da Europa.
Ou seja, sem o Islã não haveria Renascimento. Para a intelectualidade acadêmica que vê nas ideias iluministas e revolucionárias o ápice da cultura ocidental, isso representa uma verdadeira red pill. Mas esta foi apenas uma fala de Obama. Há outras e de autoridades religiosas bem mais influentes sobre a alma de fiéis, como o Papa Francisco, que desassociou o Islã de toda a sua vertente terrorista, citou um filósofo islâmico em sua encíclica (Laudato Si) sobre o meio ambiente. Ou o arcebispo de Cantebury, que ao comentar sobre a possibilidade da adoção da lei da Sharia pelo Reino Unido, afirmou que isso beneficiaria a sociedade.
O arcebispo sugeriu que “a lei sharia estava enraizada no sentido de fazer a vontade de Deus nas coisas ordinárias da lei”, mas acabou sendo forçado a se retratar da declaração pouco cristã. Na verdade, exemplos como este estão por toda a parte e com a coroação de Charles III, cujas suspeitas de conversão ao Islã em segredo já não são segredo algum, duvidar disso pode ser considerado cumplicidade no processo.
Diante disso, começamos a nos perguntar o que estaria por trás do recente episódio no qual o bispo de Londrina deu a comunhão a um conhecido sheik muçulmano que, para piorar, levou o Corpo de Cristo consigo em clara intenção sacrílega. Fariam parte da mesma tariqa? Quantos conservadores em nosso meio, defensores da fé ortodoxa ou tradicionalista, mas simpáticos ao discurso ideológico de Dugin ou de Putin contra o Ocidente, não estariam sendo cooptados sutilmente ou conscientemente por este movimento?
Por trás do engodo duguinista, portanto, há o engodo perenialista, cuja principal força impulsionadora tem sido o estudo mais ou menos descuidado da obra de Guénon como espécie de “antídoto” contra o materialismo globalista. Já o engodo globalista se dá justamente na ideia errônea de sua natureza materialista, quando na verdade responde às mesmas autoridades espirituais e esotéricas do lado perenialista. Esse conjunto de engodos só engana os que se julgam estudados, acordados e “redpillados” pelas conspirações, muitas vezes mais ingênuos do que gostariam de transparecer.