Nesta quarta-feira, dia 10 de maio, quando Alexandre de Moraes ordenava que o Telegram confessasse publicamente um crime inexistente no Código Penal, há exatos 90 anos os nazistas queimavam livros em praça pública, em um dos episódios mais marcantes na história da censura mundial.
Com o apoio de organizações de estudantes universitários da época, além de professores e bibliotecários, foram reunidas pilhas de milhares de volumes de livros vistos como perigosos pelo regime. Livros escritos por judeus e não judeus, que continham ideias contrárias à ideologia do regime, foram queimados na noite de 10 de maio, após um desfile noturno com tochas e cantando hinos enquanto faziam imensas fogueiras. Mais de 25 mil livros foram destruídos.
Inspirados por um ideal de “limpeza” da literatura e de publicações, autores como Stefan Zweig, Thomas Mann, Sigmund Freud, Erich Kästner, Erich Maria Remarque e Ricarda Huch eram perseguidos na época. Thomas Mann, que havia recebido o Nobel de Literatura em 1929, fugiu para a Suíça em 1933 e, em 1939, para os Estados Unidos.
Mais tarde, escreveu ele:
Se tivesse ficado na Alemanha ou retornado, talvez já estivesse morto. Jamais sonhei que no fim da minha vida seria um emigrante, despojado da nacionalidade, vivendo desta maneira!”
As multidões também queimaram as obras do admirado poeta judeu alemão Heinrich Heine [OBS: que havia se convertido ao cristianismo] que, em 1820, havia escrito: “Onde se queimam livros, acaba-se queimando as pessoas”.
No ano seguinte, uma lista de mais de 3 mil livros foi montada para que a censura impedisse sua circulação.
Antecedentes
A iniciativa da queima de livros foi possível graças à participação ativa de estudantes universitários e até reitores das universidades alemãs que apoiavam o governo.
Em 6 de abril de 1933, a Associação Nazista Estudantil Alemã divulgou nacionalmente um manifesto intitulado “Ato contra o Espírito Não Germânico”, em defesa de uma “depuração“ ou “limpeza” literária pelo fogo. O ato do dia 10 de maio de 1933 foi simbólico e representava a paranoia estudantil em apoio fanático a um governo, em um episódio que inaugurou um assombroso período de censura política e controle cultural na Alemanha. Naquela noite, os estudantes revolucionários marcharam à luz de tochas em gritos “contra o espírito não alemão”, uma campanha que havia sido iniciada pelo slogan nazista do partido e seus instrumentos de propaganda.
Em 1933, Joseph Goebbels, ministro nazista da “Propaganda e de Esclarecimento do Povo”, havia criado uma campanha centralizada para alinhar as artes e a cultura alemãs com os objetivos do regime. O governo desativou as organizações culturais judaicas e de outros grupos acusados de serem “politicamente suspeitos”, ou que realizavam ou criavam obras de arte que os nazistas classificavam como “degeneradas”.
A classe estudantil estava na vanguarda do movimento nazista. Por décadas, a força do ultra-nacionalismo e do anti-semitismo das organizações estudantis de classe media, de cunho secular, vinham crescendo. Com o final da Primeira Guerra Mundial e o sentimento de humilhação nacional a partir do Tratado de Versalhes, muitos estudantes se opuseram à República de Weimar (1919-1933), encontrando na ideologia nacional-socialista o ingrediente ideal para o seu fervor revolucionário.