Há certos atos, decisões e práticas que atraem maldições diante de Deus. Um desses caminhos a Igreja chama de naturalismo. Quando o homem chama para si o poder total sobre sua vida, seu destino e o do mundo, como se coubessem somente aos esforços humanos, Deus o abandona à própria sorte. Não é por maldade que Deus faz isso, mas por misericórdia. É exatamente esta tendência que cresceu no mundo desde a chamada Renascença, quando os homens decidiram criar para si uma nova cosmovisão segundo a qual o Universo é uma máquina de leis próprias, autoreguladas e autocriadoras, cujos acontecimentos são aleatórios em um jogo de azar atemorizador que terminou por substituir a fé pela razão, a caridade pelo humanismo, a verdade pela mentira.
Foram vários os acontecimentos filosóficos que deram origem ao naturalismo. Mas podemos centrar em um deles: O chamado dualismo cartesiano, distinção fundamental que René Descartes fez entre mente (res cogitans) e corpo (res extensa). Essa separação gerou o problema mente-corpo, ou seja, a questão de como algo imaterial (mente) pode interagir com algo material (corpo).
A separação cartesiana foi um dos conceitos mais influentes da filosofia ocidental, moldando a ciência, a psicologia e a metafísica. No entanto, gerou um problema filosófico duradouro sobre a relação entre mente e corpo, ainda discutido na filosofia da mente e nas ciências cognitivas. Sua origem remonta à filosofia de Platão e Aristóteles, que criaram uma forma de dualismo. No entanto, tal erro foi retirado da filosofia grega pelos escolásticos medievais para não contaminar a teologia com heresias. Foi este mesmo erro que os humanistas da Renascença se inspiraram para recriar um mundo cognitivo de molde pagão, o que determinou e definiu muito da modernidade.
Cientistas como Galileu, Kepler e Newton passaram a descrever o mundo como regido por leis naturais, sem necessidade de intervenções sobrenaturais. O mecanicismo cartesiano (de Descartes) e o empirismo de Francis Bacon ajudaram a consolidar uma visão naturalista da ciência. Este processo, depois de influenciado pelo cristianismo, também deu origem ao que conhecemos como direito natural, base das declarações de Direitos Humanos etc. Ou seja, criaram um sistema ético racional que independe de qualquer fator sobrenatural, excluindo Deus.
O resultado é um mundo no qual as pessoas comuns, os cidadãos, mesmo quem nunca leu esses cientistas, tornaram-se incapazes de imaginar um mundo regido pelo sobrenatural. O maior problema do naturalismo, porém, é que ele esconde uma crença herética sobre o mundo, remontando não a um valor da razão, mas a um universo diabólico.
Não existe vácuo espiritual ou ausência de espírito na alma humana. Isso significa que, ao acreditar que não há Deus ou que Ele não está no comando dos acontecimentos, a alma humana põe outro ente no lugar. Retirar a causa das coisas não elimina as consequências nem cria fatos “sem causa”, mas põe no lugar uma causa desconhecida, misteriosa, que é facilmente acomodada a diversas outras de mil formas adaptáveis à mente e aos desejos humanos. Em outras palavras, ao retirar Deus da sua vida, o homem põe o demônio sentado no trono da sua alma. Este é o resultado prático do naturalismo.
As críticas ao naturalismo que o vinculam a uma mera ausência de Deus pecam por justamente utilizar pressupostos naturalistas, isto é, de que é possível viver sem Deus. Quando se vive um mundo “sem causa”, o que se está fazendo, na verdade, é vivendo em estado de inimizade declarada a essa Causa Primeira, propondo outra no seu lugar.
Hoje o naturalismo se disfarça de mil formas. Ele pode se esconder por trás de um culto à cultura como intermediação da ação divina ou da busca da sabedoria, já que caberia ao próprio homem conquistá-la, concluindo numa ausência da possibilidade da ação de Deus. A intermediação de mitos pagãos como forma de compreensão pretensamente aprofundada das verdades do cristianismo, ou até somente do funcionamento da sociedade, levam à conclusão do naturalismo e a exclusão da ação da graça santificante e do mundo sobrenatural.