São Paulo, o eremita, é considerado pela Igreja como sendo o primeiro eremita a viver no deserto. Ele foi seguido por Santo Antônio abade, pai do monaquismo, que testemunhou a sua santidade. Segundo registros de São Jerônimo, o primeiro eremita teria nascido por volta do ano 228 d. C. A Igreja celebra a sua memória no dia 15 de janeiro.
Paulo ficou órfão aos 14 anos e, aos 22, diante da perseguição do imperador Décio contra os cristãos, por volta do ano 250, resolveu migrar para o deserto, não para fugir, mas para oferecer maiores penitências por tudo o que a Igreja estava passando. Paulo acreditava que lá poderia encontrar Deus, assim como vencer o demônio e suas tentações, tarefa para a qual passou a se dedicar dia e noite. Passando a viver em uma cabana no deserto, conta-se que Paulo se alimentava de frutos de uma palmeira, mas principalmente do pão que era trazido por um corvo a ele, confiando-se totalmente à Providência divina.
A partir do claustro da contemplação no deserto, Paulo lutou bravamente contra as heresias do seu tempo, unido em oração com Santo Atanásio.
Santo Antônio abade, tendo notícia, em sonho, da existência de outro eremita, foi ao seu encontro. Após muita insistência para que o eremita removesse a pedra que fechava a gruta em que vivia, cumprimentaram-se pelo nome sem nunca terem se conhecido antes. Em seguida, ambos ajoelharam-se e agradeceram a Deus. O corvo, que costumeiramente trazia um pedaço de pão para Paulo se alimentar diariamente, trouxe naquele dia um pão inteiro, de maneira a alimentar os dois monges do deserto.
São Paulo, o eremita, contava cerca de 90 anos naquele momento, tendo passado a vida inteira em oração no deserto, entregue completamente à Providência de Deus e aos seus desígnios. Sua vida equivale à mensagem contra o orgulho da autossuficiência humana e do ego ferido pela impotência material, o que testemunhou por meio de Santo Antônio os princípios mais caros da vida monástica e eremita: o radicalismo na entrega e na submissão à Santa Igreja contra todos os cálculos e temores humanos.
No dia seguinte ao encontro dos dois santos, Paulo profetizou que iria morrer e pediu a Santo Antônio que fosse ao mosteiro buscar um manto que ganhara do bispo Santo Atanásio, com o qual gostaria de ser envolto o corpo após a morte como um símbolo da união entre os dois, na oração, nas batalhas da Igreja contra heresias como o arianismo. O santo obedeceu ao desejo e, quando retornou, Paulo já estava morto, ajoelhado e de braços estendidos em oração.
Conta-se que Santo Antônio pôde ver a alma do amigo subir aos céus cercada de anjos e santos, junto dos próprios Apóstolos. Conta a tradição, que neste instante dois leões apareceram no deserto e cavaram um buraco, no qual Santo Antônio enterrou o corpo do santo companheiro.
O estado eremítico, assim como a vida religiosa contemplativa e monástica, sempre foi o sustentáculo espiritual da Igreja, com o qual permaneceu sempre unida em oração. Trata-se da função orante por excelência. Sempre que períodos de grandes crises e perturbações ameaçavam a Igreja, foram os eremitas e monges que lutaram bravamente a batalha espiritual contra as potestades.
Os nossos dias de grande crise moral e espiritual, quando a oração é deixada de lado, a vida monástica acaba sendo vista como improdutiva ou inútil. O mundo, que prefere a produtividade, a ação e o ativismo da mudança social e humana, vê no sentimento de autossuficiência a sua verdadeira cosmovisão: o pecado, a saciedade da vida e dos prazeres são a metafísica própria do mundo atual, no qual as pessoas passam a ser meros animais em busca de satisfação dos apetites diversos.
Essa é a situação em que a vida monástica, e o ermo, é cada vez mais necessário, seja nos conventos ou nos desertos interiores da vida mundana e sem sentido, que necessita de mais e mais entrega e abandono de si mesmo em submissão cada vez mais radical à lei de Deus.