Em entrevista ao canal português neste sábado (22), RTP, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) disse que a Ucrânia é a “grande vítima da guerra”. A fala do presidente veio logo após ele ter criticado países ocidentais pelo envio de armas à Ucrânia. Em Portugal, Lula foi questionado por jornalistas, fingiu não entender a pergunta, enrolou-se e acabou dando resposta contraditória. A confusão é compreensível pela problemática da questão, que divide a esquerda no mundo, diante de um cenário de crescimento de ideologias de “terceira posição”.
“Há uma posição muito clara: o Brasil condenou a Rússia por invadir o espaço territorial da Ucrânia, ponto. […] O que o Brasil não quer é se alinhar à guerra. O Brasil quer se alinhar a um grupo de países que precisa trabalhar para construir a paz”, disse Lula ao RTP.
A frase de Lula é clara, apesar da intenção de confundir. Ele é contra a invasão pela Rússia, mas (ênfase no “mas”), se diz “contra a guerra”. A invasão é uma guerra, mas ele separa em duas: a invasão e a “guerra”. Se ele já condenou a invasão pela Rússia, do que ele está falando quando fala em “guerra”? Lula se refere, no fundo, à defesa da Ucrânia. Ou seja, Lula é contra a invasão, mas também é contra que a Ucrânia se defenda. Não há ambiguidade nisso. O que há é o medo de desagradar um dos lados da questão. Mas por que?
Esquerda, direita e… terceira posição
O tema é motivo de divisão entre grupos de esquerda, o que aponta para o crescimento de uma terceira vertente, fruto da emersão de uma aparentemente velha esquerda e velha direita. A esquerda brasileira está muito mais próxima de se formatar como um novo tipo de fascismo do que a direita. Exceto, é claro, se a direita for burra o suficiente para ser confundida.
O jornalista esquerdista Breno Altman, da coluna Opera Mundi, atualmente hospedado no UOL, é favorável à postura totalmente alinhada à Rússia e China, tanto no conflito ucraniano quanto sobre Taiwan. O Opera Mundi era tradicionalmente financiado por George Soros, um claro aliado do discurso pró-Ucrânia atualmente. O que aconteceu? O Opera Mundi costuma fazer lives com nomes importantes da esquerda brasileira, como dirigentes históricos do MST, petistas ortodoxos e nomes como José Dirceu, com quem a coluna fez uma entrevista importante no final de 2022. Nela, Dirceu manteve a opinião de que o novo governo petista precisa evitar as concessões que fez com “o grande capital”, como das outras vezes.
Com isso, Dirceu, assim como o Opera Mundi, alinham-se à esquerda mais clássica, aquela representada, entre outros, pela Causa Operária, do jornalista marxista Rui da Costa Pimenta. O Partido da Causa Operária (PCO) vinha angariando simpatia até da direita bolsonarista por ser um violento crítico do ministro Alexandre de Moraes, a quem chamou de “skinhead de toga” e foi punido pelo STF por isso, tendo a conta bloqueada.
O que une Opera Mundi ao PCO, quanto à política externa, é o profundo antiamericanismo clássico, aquele que vê os EUA como o mal essencialmente ligado ao capitalismo, na melhor visão da Guerra Fria mantida viva. Mesmo presidentes de esquerda e claramente antiamericanos, como Biden e Obama, são criticados por essa ala da esquerda, vistos como fascistas simplesmente por representarem o “grande satã”, como os muçulmanos chamam os EUA. Claro que essa crítica não se restringe aos EUA, sendo o “eurocentrismo” outro grande fantasma que atormenta essa ala da esquerda que repete os aparentemente ultrapassados chavões do século passado. Isso mostra o quão desatualizados estão… os direitistas, ao acharem que a esquerda se resume a defesa de política identitárias. A esquerda nunca aceitou essas coisas, exceto como ferramenta para explorar os conflitos e ampliá-los, gerando mais caos social que justifique, ao final, mais controle estatal das vidas humanas.
Já a outra esquerda, aquela que recebe grandes investimentos de fundações internacionais ligadas a grandes farmacêuticas, grande indústria de armas e grandes traficantes de drogas, essa é contrária à invasão da Rússia por saber de sua clara mudança de narrativa global, que desfaz ou desconstrói a dicotomia de Karl Popper, das sociedades abertas versus sociedades fechadas, democracias versus ditaduras populistas nacionalistas. Para essa esquerda, nenhuma defesa nacional, territorial ou cultural está acima do direito mundial por todos os recursos, que mediante a agenda ambientalista universalizada, pretende controlar a Terra e sua população por meio da ideologia de gênero e o aborto.
Esse debate entre esquerdas pretende formar uma nova dicotomia política que pode conceder à mentalidade revolucionária uma hegemonia de princípios: de um lado, a esquerda internacionalista e do outro a nacionalista. No meio, a população, os conservadores e os cristãos genuínos buscando não se associarem a nenhuma das forças globais, mas, ao mesmo tempo, esquivando-se de condenar os espantalhos criados por eles.