Por Bernardo M. Krobel
Na sua evolução, os povos reuniram-se em territórios, guardando cada qual sua peculiaridade na sua formação. Para que os membros destes povos pudessem se organizar, estabelecendo regras de convívio social, foram formuladas por pessoas determinadas um conjunto de regras de convivência. Alguns destes povos escolhiam, através de sua totalidade de integrantes ou por parcela deste quem os representaria para formular tais regras; outros aceitaram a imposição de uma pessoa, ainda que provisoriamente, que ditaria as tais regras sociais; e outros aceitaram a ficção de quem eles elegessem quem os representariam na formulação de suas leis. Mais uma vez, sempre respeitando costumes, territórios e ideologias dominantes.
Nos dias de hoje, com o bombardeio informacional que qualquer pessoa pode ter acesso através de seu smartphone, vez ou outra assistimos às declarações dos mais desconhecidos cidadãos até os mais letrados e politicamente influentes, tratando ora do “Estado de Direito”, ora do “Estado Democrático de Direito”.
Mas, afinal, existe diferença entre estes dois tipos de Estado? Antes de se obter uma resposta fiel a este dilema, é preciso compreender, ainda que perfunctoriamente, o que é Estado, o que é Direito e o que é Democracia.
Os juristas constitucionalistas costumam dizer, na disciplina da Teoria Geral do Estado, que o “Estado” nada mais é que organização de três condicionantes básicas e simultâneas: a existência de um território delimitado, ou seja, com fronteiras e soberano; a existência de um povo neste mesmo território; e um governo que organize a execução das leis para a pacificação social.
O Direito é um conjunto de regras vigentes em um determinado território em um determinado espaço de tempo. Alguns preferem dizer que são somente as normas escritas; outros, porém, incluem neste conceito as regras morais. Entretanto, este debate transcende o objetivo deste artigo, razão pela qual não se tratará, aqui, deste questionamento, optando-se por levar em consideração aquele conceito apresentado.
Já a Democracia, bem, esta, a meu ver, sempre teve um conceito milenar que, hodiernamente, vêm rapidamente sendo deformado por questões puramente ideológicas. Prefiro entender que a Democracia é o resultado da mais pura vontade do povo, representada por membros justamente escolhidos, que obedecem, ou deveriam obedecer, a fiel vontade da maioria que nos mais altos cargos de um País os colocaram.
No Brasil, conforme preceitua nossa Constituição, vivemos sob o manto da Democracia. Participamos, obrigatoriamente, por força de lei, de eleições periódicas, nas quais elegemos as pessoas que irão governar e legislar, representando mais de 210 milhões de pessoas, ou seja, o nosso povo.
Pois bem, desvendados, ainda que de forma sintética, os significantes apresentados, já se pode formular o conceito das categorias compostas “Estado de Direito” e “Estado Democrático de Direito”.
Estado de Direito é aquele território onde um governo composto por alguém, ou alguns, dirige a vida em sociedade de um povo com base nas leis. Tais leis podem ser escritas em sua totalidade, como no Brasil, ou parcialmente escritas, como na Inglaterra ou nos Estados Unidos da América.
Importante notar que no “Estado de Direito” resta omitido o verbete “Democrático”. E isso não é por acaso.
Na história mundial, não foram raros os casos de que um déspota, sem o menor aviso, ditava e impunha, inclusive atentando contra a vida e o patrimônio das pessoas, sua vontade a bel prazer. Nestes casos, não havia lei; havia apenas a vontade de um soberano, que a conseguia impor, mediante a força praticada por subalternos hediondos.
Esta situação perdurou por vários séculos até que se chegou a determinado momento em que tamanha imprevisibilidade do déspota, por tanta maldade que este causava ao povo, acabou sendo suprimida pela força deste mesmo. Mas o tirano não queria perder seu poder. Para isso, o déspota, criou uma camuflagem, chamando-a de “Estado de Direito”.
Para que o “Estado de Direito” fosse criado, era preciso que o preço a ser pago pelas atrocidades cometidas pelo déspota não recaíssem sobre os ombros de apenas uma pessoa, mas que ela fosse dividida, e até mesmo “perpetuada” com base numa falsa narrativa de que quem impunha a crueldade fosse algo abstrato. E a culpada foi a lei.
Seja por falsos profetas ou por falso representantes escolhidos a dedo, a lei continuou a ser cruel contra o povo, assim como era a vontade unilateral do tirano. O déspota e seus subalternos, quando do acometimento de seus podres desejos e interesses, apenas defendiam-se, dizendo que uma barbaridade da imposição estatal apenas aconteceu “porque a lei assim determinou”. Então veja, prezado leitor, que a lei ganhou um status de mandatária, enquanto os executores descenderam, se assim se pode dizer, a meros respeitadores do Direito.
Mas, este “Estado de Direito” ainda existe no mundo moderno? Sim! Vide republiquetas – este verbete, por si só, merece um artigo exclusivo – como Cuba, Venezuela, Nicarágua, entre tantas outras ditaduras que existem neste Mundão.
Por outro lado, em outros territórios mais sérios, o corpo social, quiçá estupefato de tantas atrocidades, resolveu, em determinado momento histórico, organizar-se como “Estado Democrático de Direito”. Um exemplo destas é o Brasil, conforme preceitua o artigo 1º, da Constituição Federal de 1988.
O “Estado Democrático de Direito”, ainda conforme dispõe a Constituição vigente em seu parágrafo único do indigitado artigo 1º, caracteriza-se pelo fato de que “todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição”. Ou seja, a formulação e execução das leis brasileiras – e também de outros países como por exemplo a França, Inglaterra, Japão etc. – se dá por meio de representantes eleitos pelo povo. É a chamada democracia representativa.
Como nos mostra a história, apesar dos gigantescos esforços feitos principalmente nos bancos escolares e universitários, foram as nações que adotaram o puro “Estado Democrático de Direito” que conseguiram melhores padrões culturais, financeiros, de liberdade e de respeito aos verdadeiros Direitos Humanos.
Porém, como se vê atualmente, o “Estado Democrático de Direito” vem paulatinamente perdendo suas virtudes. Constata-se, sem grande dificuldade, que a maioria da população não mais consegue impor a sua vontade. As “grandes minorias” ganham espaço e impõem seus ideais através de narrativas baseadas, por exemplo, na necessidade de empatia entre as pessoas, proteção de pseudo-Direitos Humanos obviamente desvirtuados, como uma quase impossível ressocialização de malfeitores, ideologia de gênero e por aí vai.
Isso sem falar nos falsos representantes, fáceis de se pescar nos Poderes Executivo e Legislativo dos entes federados desta Nação, que se elegem com propostas virtuosas e, após empossados, submetem-se as mais espúrias vassalagens politiqueiras, frustrando os cidadãos que o puseram no poder, que acreditavam que aqueles poderiam fazer deste território um País melhor. Exemplo disso é o pula-pula de políticos entre partidos de diversas matizes ideológicas; traições políticas que visam a manutenção de cargos e poder; e a pura ginástica eleitoral da vaidade para não ficar mal com a “opinião pública” (leia-se mídia).
E como resgatar os valores do “Estado Democrático de Direito”? Prezado leitor, entendo que não há uma fórmula mágica que, ao ser posta em prática, possa gerar resultados a curto/médio prazo. É claro que o trabalho deve ser feito a partir de ontem. Mas, se corretamente for feito, creio os resultados aparecerão somente daqui a meio século. É preciso resgatar os valores morais; enaltecer a cultura; fazer as pessoas reconhecerem que existe uma grande diferença entre o belo e o feio, entre o bom e o mau; e, principalmente, de que as pessoas tenham Deus em seu coração. Sem esses valores básicos como fundamentos, nem vale a pena iniciar os trabalhos.