Elemento catalizador de parte importante do bolsonarismo, o antipetismo voltou a dar as caras na maioria dos grandes jornais do país, com exceção ainda dos veículos ligados ao grupo Globo. Em um editorial que fez petistas rasgarem as vezes, a Folha de S.Paulo chegou ao ponto de afirmar que o bolsonarismo, se abandonasse o seu “autoritarismo, até poderia liderar uma oposição saudável ao PT”. É óbvio que se houve autoritarismo de Bolsonaro ele se resumiu a defender direitos de cidadãos a não usarem máscaras e não serem obrigados a tomar vacinas experimentais. Fora isso, outra forma de interpretar como autoritarismo seria a sua política de segurança.
Com o editorial, fica evidente que arrependimento pode não matar, mas produz mudanças consistentes que podem ser até constrangedoras. Depois que a Folha estampou sobre os riscos das vacinas da Pfizer, poucos meses depois de tachar como “negacionistas” médicos e jornalistas que escreviam a respeito, parece que há um movimento de reconhecimento de quem estava certo o tempo todo. Mas o que quer dizer um retorno do antipetismo neste exato momento e qual a verdadeira motivação que pode vir daí?
O antipetismo é visto por muitos como insuficiente contra a esquerda, já que concentra apenas na sigla maldita os males do Brasil, em geral resumidos aos equívocos econômicos historicamente defendidos pelo PT e praticados em seus governos. Já o bolsonarismo foi uma espécie de upgrade, resultado de uma ampliação do espectro que incluiu toda a esquerda, os comunistas, e grande parte do globalismo com suas agendas identitárias. Neste aspecto, o bolsonarismo representou uma evolução natural do antipetismo e isso é o que faz com que muitos encarem o retorno dessa aversão ao PT como um retrocesso em termos de opinião pública.
Esse retorno do antipetismo era previsto por quem preferisse Bolsonaro nas eleições, mas costumava-se ressaltar que a censura, a perseguição e as prisões de opositores iriam suplantar qualquer possível “vantagem” desse retorno ao antipetismo, cuja adesão confirmamos até mesmo na grande mídia. Isso porque representa o retorno da boa e velha estratégia das tesouras observada quando a política era loteada entre PT e PSDB num simulacro de “esquerda e direita”, sendo os tucanos confundidos com direita.
Fato é que nomes como Sérgio Moro, profundamente ligado às pautas jurídicas de entidades internacionais como a Open Society, voltaram ao imaginário político popular na condição de esperanças de moralidade política. Até mesmo indigentes políticos como Kim Kataquiri e os meninos do MBL parecem estar felizes aproveitando uma lua de mel com as viúvas de Bolsonaro, colhendo exatamente o que plantaram no antibolsonarismo que os manteve no seu virtuoso discipulado da grande mídia e da esquerda durante os últimos quatro anos.
O que tem tranquilizado conservadores, liberais, centristas e políticos de carreira é a possibilidade, nada remota, de que uma derrubada de Lula ponha na presidência Alckmin, visto agora como salvação. Pouco se sabe o que poderia ser um governo “alquimista”, embora muitos o associem a uma possível repetição do governo Temer, para ser otimista.
Para a esquerda, Alckmin é um mistério e visto com suspeita. Por ser historicamente mais liberal e ter pautas vistas como autoritárias pela esquerda na parte da segurança, o católico ligado à Opus Dei provavelmente frustraria algumas políticas petistas. No entanto, a fraqueza de sua personalidade e suspeitas que pesam sobre ele o tornariam presa fácil à política tradicional de Brasília.
Por outro lado, essa possibilidade também representaria para os conservadores a fuga do modelo das tesouras: sendo Alckmin um inequívoco poste globalista que atenderia aos anseios do centrão e de todas as bancadas que o colocassem na parede, não teria força política para lidar com ameaças e acusações por sua suspeita ligação com PCC. Isso significa que, para conservadores, um governo Alckmin representaria um upgrade narrativo, pois daria a oportunidade de convencimento de grande parcela da população sobre os perigos da esquerda tucana e fabiana quando travestida de liberal. Mas é claro que esta vantagem só traria frutos se os conservadores se preparassem para grandes empreendimentos de conscientização, o que atualmente não é o caso.
Resumindo, uma derrubada de Lula representa hoje um consenso político crescente, desejado por um número cada vez maior de grupos, setores, bancadas e movimentos no Congresso e, talvez em breve, até mesmo no Executivo. O antipetismo, embora pareça representar um retrocesso por sua ligação com a gênese do bolsonarismo, pode levar a um salto qualitativo de narrativa e catapultar a crítica mais profunda da esquerda a setores populares, midiáticos, até alcançar a opinião pública por meio de novas imagens e informações que toquem o sentimento nacional. Mas, com eu disse, tudo vai depender do quanto os conservadores estarão mais nas redes sociais ou nos locais de relevância social nos momentos chave para atuarem de forma eficaz.