[Primeira parte do artigo publicado originalmente na primeira edição da Revista Estudos Nacionais (dezembro/2017)]
A comoção em torno de uma mostra cultural na qual se apresentava imagens de ofensa religiosa, além de insinuações à prática da pedofilia, iniciou um debate acalorado no país. Somado a isso, a encenação de um homem nu diante de crianças, no Museu de Arte Moderna, em São Paulo, ajudou a chamar a atenção para a existência de um movimento fortemente atuante, embora pouco conhecido da população. Trata-se, na verdade, de ideias que sempre estiveram diante de nossos olhos.
O horror provocado pelas imagens e cenas que insinuavam e remetiam a atos sexuais envolvendo crianças, fez com que muitos se antecipassem na acusação de uma apologia ao crime de pedofilia, o que obviamente não era o caso. Prontamente recebida como insulto e falsa imputação de crime, a acusação acabou desviando a atenção do longo processo de dessensibilização cultural de décadas, escondido por trás da ingenuidade dos que se escandalizaram com as recentes imagens, mas não com as ideias que vieram antes, muito antes. O movimento pela normalização da pedofilia está por demais consolidado nas classes artísticas e na elite intelectual do mundo para ser tão facilmente denunciado e punido. Ele rasteja lenta e discretamente pelos meios literários, científicos e acadêmicos desde, pelo menos, o final do século XIX.
Os primeiros estudos científicos
Em 1886, o psiquiatra alemão Richard von Krafft-Ebing, no livro Psychopathia Sexualis, foi o primeiro a categorizar homossexualidade e pedofilia igualmente como perversões ou psicopatias sexuais que podiam ser tratadas, incluindo aí o sadismo, zoofilia, necrofilia etc. Descreveu-as como “excitação da vida sexual por estímulos inadequados”.
Alguns anos depois, em 1898, o médico e psicólogo britânico Havelock Ellis, deu uma outra abordagem para as perversões sexuais. Ele questionava abertamente a ideia de normalidade sexual, assinalando que as perversões provêm daquilo que chamamos normalidade. “Enquanto ignoramos os limites da sexualidade normal, não somos capazes de fixar regras razoáveis para a sexualidade”, dizia em seu livro Inversão sexual (1898).
Embora tratasse a pedofilia, junto do homossexualismo, zoofilia, necrofilia etc, como perversões doentias e perigosas, já começava a questionar os padrões de normalidade, o que o faz ser considerado um dos patronos da ideologia de gênero. Ellis pode ser considerado um impulsionador de uma série de movimentos contemporâneos, além do ativismo gay, mas também do ativismo contraceptivo, ao inaugurar a abordagem da sexualidade deslocada do seu caráter reprodutivo.
O objetivo dos estudos dessa época era a descriminalização da homossexualidade mediante a sua consideração de anormalidade patológica, apesar de já estar presente o questionamento do conceito de normalidade, algo que viria a crescer no século seguinte.
O ativismo gay já existia por meio de seitas secretas como a Ordem de Queroneia, presidida por George Cecil Ives, que visava unir os homossexuais na luta por direitos civis e proteção contra a perseguição policial de então. A seita existe ainda hoje e conta como um dos seus objetivos a destruição da moral tradicional. Ives foi também o fundador da Sociedade Britânica para o Estudo da Psicologia do Sexo, da qual faziam parte Havelock Ellis e George Bernard Shaw. Sobre história das estreitas relações entre lobby gay e o ocultismo, leia a terceira parte da série.
Ao longo do século XX, muitos foram os estudos sobre o problema da pedofilia aliado ao homossexualismo. As abordagens, como a de Sigmund Freud, buscavam a análise puramente cientifica e funcional da sociedade, apontando tais práticas como nocivas e prejudiciais à saúde social. Ao mesmo tempo, Freud deu início a um processo de sexualização da infância, que mais tarde começou a tomar forma através de seus seguidores.
Paralelamente, no final da década de 1920, ocorriam as reuniões da Liga Mundial para a Reforma Sexual, para a qual o próprio Freud foi convidado e contou com a presença de Bertrand Russell e Dora Russell, um movimento mais ligado à eugenia e ao controle de natalidade. Tais reuniões criaram as bases do que hoje é aplicado em matéria de Educação Sexual e era organizado por ativistas como o médico Magnus Hirschfeld, ativista homossexual.
Os defensores da ideia da “reforma sexual” ligavam-se às escolas funcionalistas e neomalthusianas. Tinham o claro objetivo da “racionalização” da atividade sexual, separando-a da função procriativa, em um contexto histórico de preocupação com avanço populacional.
A primeira abordagem de defesa da pedofilia veio por meio de um colaborador do dr. Freud, que se tornou quase um patrono da educação mundial: Wilhem Reich, membro do Partido Comunista Alemão. Em seu livro People in Trouble, no capítulo chamado Organizando a política sexual na Alemanha, Reich estimou existir na Alemanha daquela época aproximadamente oitenta organizações independentes estudando o tema sexual, com cerca de 350 membros. Em geral, reivindicavam direito ao aborto, controle de natalidade e fim da repressão ao homossexualismo. Reich percebeu que essas organizações falhavam no tratamento do problema da sexualidade na juventude e erravam ao não direcionar uma abordagem crítica radical nas estruturas de instituições como o casamento e a família.
Havia um embate entre duas correntes de pensamento muito influentes no início do século XX: funcionalistas e marxistas. Os funcionalistas, adeptos do conceito de reforma sexual, herdeiros dos neomalthusianos. Era a linha reacionária e cientificista, moderna, cujo objetivo estava no controle populacional, na racionalização da vida e administração funcional da sociedade.
De outro lado, os marxistas propunham a abordagem da crítica total, da modernidade, da família, interessados na revolução social com fins na sociedade igualitária. Para isso, muitos (como Reich) acreditavam que a derrubada da superestrutura burguesa só poderia se dar por meio da destruição do conceito de família, já que, como dizia Engels em seu livro célebre A origem da família, da propriedade privada e do estado, o pátrio poder familiar, tal como a estrutura familiar tradicional, era a base real, o lastro, da propriedade privada e, com isso, do poder estatal burguês. Funcionalistas e marxistas se confrontavam em uma guerra que caminhava, dialeticamente, na mesma direção. Reforma sexual de um lado, revolução sexual de outro.
Em 1933, no livro Charater Analysis, Reich defendeu que a liberação sexual era o único caminho para haver saúde sexual, sem as quais, nenhuma reforma política teria êxito. De acordo com Anthony Giddens,
“embora defendesse a igualdade da expressão sexual para as mulheres, [Reich] deu particular atenção aos direitos sexuais das crianças e dos adolescentes. Deve ser dado às crianças o direito de se envolver em jogos sexuais com outras crianças e também o direito de se masturbar; devem também ser protegidas do domínio de seus pais. Os adolescentes devem ter a oportunidade de satisfazer as suas necessidades sexuais sem qualquer controle, para que possam ser os agentes da futura mudança social”.
Do lado funcionalista, na década de 1940, o médico inglês Clifford Allen publicou The Sexual Perversions and Abnormalities, um estudo que prometia estudar as perversões sexuais de forma puramente científica. Influenciado por Freud, o autor chamava atenção para o fato de que as perversões sexuais eram mais comuns do que se imaginava. E apresentou as primeiras estatísticas sobre crimes sexuais na Inglaterra, e o crescente número de casos a partir do final da década de 1930, período marcado pela guerra. Tais perversões, segundo Allen, se tornavam mais comuns em épocas de crises.
“Os adolescentes devem ter a oportunidade de satisfazer as suas necessidades sexuais sem qualquer controle, para que possam ser os agentes da futura mudança social”.
Embora essa noção negativa das perversões reforçasse a aversão social a elas, essa abordagem reforçava a ideia da recorrência latente de um tipo de “diversidade” sexual vista nas perversões, o que viria a ser explorado por autores subsequentes.
De outro lado, os marxistas alemães, como Reich, eram críticos à linha freudiana e expunham refutações às principais premissas, já que viam a repressão não apenas na linha psicológica, mas nas estruturas da sociedade. Da mesma forma que Freud considerava as perversões consequência da repressão sexual, os intelectuais marxistas as creditavam à vida burguesa e à sociedade capitalista. A sexualidade em uma sociedade socialista, de acordo com eles, seria a mais saudável e natural possível, já que as pessoas se encontravam livres da repressão dos valores burgueses. Diziam isso ao mesmo tempo em que relativizavam o conceito usual de normalidade sexual. Era uma questão de tempo para que as duas correntes de pensamento se unissem em uma mesma força. Na verdade, isso já estava acontecendo, como veremos, com a Escola de Frankfurt, que unia Marx e Freud em um mesmo método de crítica social.
Em 1948, foi publicado o primeiro Relatório Kinsey, um trabalho estatístico sobre sexualidade humana, mas carregado de suposições revolucionárias. Em 1938, o biólogo Alfred Charles Kinsey, especialista em vespas, havia sido convidado pela Universidade de Indiana, onde lecionada, para dar um curso sobre matrimônio e sexualidade para casais. Ele decidiu usar esse curso para uma pesquisa estatística sobre práticas sexuais. Inicialmente com seus próprios recursos, Kinsey junta pesquisadores de outras áreas e funda o Instituto Kinsey, que existe ainda hoje e é considerado uma autoridade em sexualidade e gênero. Seu primeiro relatório, Sexual Behavior in the human male, fruto das pesquisas, graças ao financiamento da Fundação Rockefeller. O relatório trazia uma ampla investigação sobre a sexualidade infantil.
A repercussão foi extremamente negativa e o governo dos Estados Unidos o acusou de estar promovendo operações de subversão anti-americana para a destruição da família. Suas experiências com crianças foram consideradas um abuso, o que rendeu discussões e processos. Além disso, foi atacado pela comunidade médica de então, com base em questionamentos sobre sua competência científica para a pesquisa. Mas, na época, foi inocentado de tudo e a única coisa que perdeu foi o envergonhado apoio da Fundação Rockefeller, sem o qual, mesmo assim, publicou seu segundo relatório, em 1953, Sexual Behavior in the human female. Ambos os relatórios abordavam questões como sexo pré-conjugais, extra-conjugais, masturbação, experiências homossexuais. Seu objetivo era o de estabelecer uma crítica embasada, empiricamente, da validade das fronteiras estabelecidas entre normalidade e anormalidade sexual. Sobre a pedofilia, Kinsey afirmou:
Se estas relações sexuais forem levadas a cabo em circunstâncias adequadas, ou seja, se o adulto sente genuinamente afeto pela criança, tal como sentiria um pai ou outro parente, tais relações poderiam ser uma experiência saudável para a criança (…). Os resultados são desfavoráveis só quando as autoridades públicas ou os pais fizeram crer à criança que este comportamento é imoral ou incorreto.
Kinsey tinha grandes preocupações sociais e buscava um embasamento para amplas reformas na sociedade. Mais do que colocar todos os atos normais e anormais em pé de igualdade moral, Kinsey chegou a afirmar que todos os comportamentos sexuais considerados desviantes e anormais eram, na verdade, normais e que o comportamento heterossexual exclusivo e que era, em si, anormal, pois era fruto de pressões sociais e inibições culturais, condicionamentos etc. Ele considerava que a sexualidade animal devia ser o modelo seguido pelo homem. Ele esperava, segundo ele próprio, utilizar suas investigações para mudar os valores tradicionais da moral judaico-cristã, que considerava paranoica. De fato, sobre a conduta heterossexual, de tudo o que ele escreveu, mereceu apenas um pequeno capítulo no final do livro.
Se estas relações sexuais forem levadas a cabo em circunstâncias adequadas, ou seja, se o adulto sente genuinamente afeto pela criança, tal como sentiria um pai ou outro parente, tais relações poderiam ser uma experiência saudável para a criança (…). Os resultados são desfavoráveis só quando as autoridades públicas ou os pais fizeram crer à criança que este comportamento é imoral ou incorreto.
Em 1981, no 5º Congresso de Sexologia de Jerusalém, a dra. Judith Reisman expôs o abuso sexual usado como método nos estudos de Kinsey. Em 1990, Reishman e Edward W. Eichel publicaram o livro Kinsey, sexo e fraude, um livro que evidencia os crimes do Relatório. Kinsey foi o responsável pela a justificação científica da pedofilia, ao afirmar que o problema da atividade sexual entre adultos e crianças era, na verdade, “a histeria e a superproteção por parte dos pais e autoridades”. Ele acreditava que “as crianças precisavam da ajuda dos adultos para desenvolver técnicas sexuais efetivas e que, portanto a sociedade devia refletir sobre isto, alterando os seus códigos morais”.
Além disso, ficaram evidentes, com base em outros estudos, que os números estatísticos sobre a prática homossexual nos EUA, na época, havia sido absurdamente inflados por Kinsey e seu interesse de justificar as perversões sexuais como normais.
Na verdade, conforme o estudo de Reisman, Kinsey se utilizou de dados coletados na população carcerária, em presídios, dizendo tratar-se da sociedade americana de então.
A influencia dos Relatórios Kinsey (e de seus continuadores como o Relatório Hite) foi fundamental para a criação de movimentos de ativistas gays e pedófilos, bem como a exploração sexual na mídia e no mercado de espetáculos. Segundo Reisman, o advento da revista Playboy foi um empreendimento diretamente ligado ao objetivo de repercutir a ideia central dos Relatórios.
Marcuse e a Revolução Sexual
Na América, Herbert Marcuse escreveu seu principal clássico Eros e a Civilização: uma interpretação filosófica de Freud, onde apontou, pela primeira vez em uma publicação de grande influência, o caráter de exploração presente na atividade sexual e nos papéis familiares, relacionando-os à luta de classes marxista. O livro aponta para a utopia socialista como a sociedade pós-repressão, profundamente diferente da “sociedade do capital”. A principal tese de Marcuse é a de que no capitalismo o corpo humano é submetido ao trabalho, à labuta. Para que ocorra a verdadeira revolução, o corpo precisa estar direcionado apenas ao prazer e não ao trabalho. O livro de Marcuse é considerado impulsionador dos protestos estudantis de maio de 1968.
Feminismo e a pedofilia
A história do feminismo com a pedofilia mereceria uma outra reportagem. A ativista feminista Shulamith Firestone afirmou em seu livro, Dialética do sexo, que a verdadeira libertação da mulher só poderia existir com a liberação sexual da criança. Ela foi uma das incentivadoras da ampliação da educação para todos, pois isso livraria a mulher dos cuidados com filhos para poder trabalhar. Também incentivou a reprodução artificial e deu continuidade à luta pela legalização do aborto e livre contracepção para um controle dos nascimentos.
Em nossos dias, feministas como Judith Butler defendem que o conceito de gênero diz respeito à variedade do comportamento humano, sendo possível considerar qualquer prática sexual como viável e representativa do desejo subjetivo, que se diferencia do sexo biológico e do gênero. Três caminhos que podem estar direcionados cada um em uma direção diversa. Para Firestone, se os sexos estão destinados a desaparecer, deverão desaparecer também todas as proibições sexuais, como a do incesto e a da pedofilia. Diz Firestone, no livro The Dialect of Sex:
‘O tabu do incesto é necessário agora apenas para preservar a família; então, se nós acabarmos com a família, na verdade acabaremos com as repressões que moldam a sexualidade em formas específicas”.
“Os tabus do sexo entre adulto/criança e do sexo homossexual desapareceriam, assim como as amizades não sexuais […] Todos os relacionamentos estreitos incluiriam o físico”.
– Shulamith Firestone
Pedofilia e a Igreja Católica
Em 2002, a dra. Judith Reisman enviou ao então Papa João Paulo II, um alerta para o uso de pressupostos e fontes supostamente científicas pela Igreja Católica. Ela se referia aos livros de Kinsey, que estavam sendo escandalosamente usados em seminários para o estudo da sexualidade humana. O documento se chamava: Reliance of the U.S. Catholic Church on the Discredited Field of “Human Sexuality” and on Sexology Advisors Whose “Scientific” and Moral Foundation Deviates Radically From That of the Church.
O livro de Michael Rose, Good bye, good man, (Adeus, homens de Deus, Vide Editorial, 2014), conta a triste realidade dos seminários católicos e da vida de milhares de padres induzidos à homossexualidade desde o seminário, graças a um esforço consciente de perverter a Igreja por dentro.
Ativismo pedófilo na universidade
O ativismo da pedofilia continua sendo algo sutil e permanece como uma construção ideológica tipicamente intelectual, que busca justificar práticas sexuais diversas sob o mote da liberação sexual, luta contra o preconceito. Hoje, nos meios acadêmicos, uma profusão de teses e dissertações propõe relativizar o conceito de infância, considerando-o um constructo social e histórico específico, característico da sociedade ocidental e burguesa.
Na mesma linha em que Kinsey afirmava o perigo da superproteção e moralismo dos pais, a família é vista, pelos ideólogos de gênero, como um local de opressão e potencial abuso, uma vez que esse abuso passou a ser ressignificado e associado ao cerceamento do “direito sexual” ou direito ao prazer etc. A militância do gênero já alcançou as Nações Unidas quando, em 2010, uma resolução reivindicava os “direitos sexuais e reprodutivos das crianças”.
Continue lendo a série:
Segunda parte: Pedofilia (parte II): o ativismo político, a KGB e o lobby na ONU
Terceira parte: Pedofilia (parte III): antecedentes ocultistas do “orgulho gay” e da pedofilia